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22 - PELOS CAMINHOS DA MÚSICA: UMA JANELA PARA O SERTÃO
- Fernando Mauro Ribeiro
- 22 de jan.
- 5 min de leitura
A literatura brasileira de modo geral se confunde com a história do Brasil. A literatura feita em Minas Gerais é tão viva quanto a tradição e os movimentos culturais que permeiam o nosso Estado, renovando e perpetuando as características de sua gente generosa, hospitaleira e trabalhadora.
O Portal Novo Tempo tem um apreço especial pelas manifestações da Arte e da cultura da nossa gente, prestigiando a literatura e as artes, reconhecendo que ao lado do progresso material, de melhores condições de vida para o povo, é preciso valorizar as criações do espírito e sua universalidade, porque são elas que garantem a permanência dos homens e das obras que realizaram. São os artistas, os escritores, os poetas que darão notícia do nosso tempo ao futuro.
Com essa compreensão, propiciamos por ocasião do 24° Aniversário do jornal a publicação de uma coluna mensal, denominada “Nos jardins da Poesia”, com a certeza de que esta é uma forma justa de comemorar a luta, o trabalho e a criatividade da população cachoeirense.
Quero registrar nossa satisfação de entregar essas publicações aos nossos leitores, à população, aos intelectuais, aos educadores e a todos que amam a literatura. Espero que elas cheguem às escolas, aos estudantes, aos professores, aos cidadãos e despertem as mesmas emoções, o mesmo entusiasmo e o mesmo orgulho que nos motivaram nesta celebração de mais um aniversário de Cachoeira Alegre.
Nessa Coluna, cuidaremos de mostrar, dentre outras coisas, os primórdios e a evolução da música caipira do Brasil, com seus grandes compositores e intérpretes. Mergulharemos na alma dessa música, vasculhando seus grandes temas, suas paixões, suas lendas.
Falaremos da viola caipira, que dá o colorido da música, que a leva de volta para o sertão, como no extraordinário programa Sr. Brasil, apresentado pelo brilhante e excepcional Rolando Boldrin, que nos deixa extasiados nas manhãs de domingo ao exibir todo o seu talento, sua simpatia explícita ao receber os convidados, cantar e contar seus causos “É que a viola fala alto no meu peito mãe...” ou como em outros versos de outros poetas: “Eu nasci naquela serra, num ranchinho à beira chão, todo cheio de buracos aonde a lua faz clarão. Quando chega a madrugada, lá no mato a passarada principia o barulhão. Nessa viola eu canto e gemo de verdade, cada quadra representa uma saudade. É a alma que se despedaça nas cordas doloridas”.
A música caipira (não a sertaneja, não a urbaneja, não a country, não essas músicas de lelelê, de fazer iê e outras banalidades que se tocam por aí, à exaustão) retrata a verdade do sertão, as pessoas simples da roça, seus sonhos, sua religiosidade, suas crendices e lendas. É constante convite e volta, uma viagem agradável de se fazer.
Venha, pois, fazer conosco, essa inesquecível viagem pelos caminhos da Música:
A VIOLA CAIPIRA:
Falar da viola caipira é falar dos símbolos mais fortes da cultura brasileira. A viola caipira é, sem sombra de dúvidas, senão o mais importante, um dos mais populares instrumentos da cultura brasileira, sobretudo, nas Regiões Sudeste e Centro-Oeste do Brasil. Isto sem esquecer o Nordeste, região onde a viola caipira, chamada viola nordestina ou viola sertaneja apresenta algumas variantes. Vale observar ainda que a mesma viola caipira pode ser conhecida também como viola cabocla, viola sertaneja ou ainda viola de pinho.
A origem da viola caipira remonta aos séculos XV, XVI e XVII, quando teve presença marcante em Portugal. Foi com os colonizadores e jesuítas portugueses, no Século XVI que a viola chegou ao Brasil com o nome de vihuela, utilizada para acompanhar canções e pequenos solos. Entre nós foi assumindo novas características, que iam desde o seu formato até suas afinações. Anos depois, já nas mãos de nossos caboclos, passou a ser conhecida como viola.
A partir dessa mudança, esse instrumento rústico se transformou num símbolo de resistência, capaz de traduzir, de forma muito clara e poética, todo o sentimento humano. A viola, em toda a sua singeleza, expressa amor, tristeza, alegria, religiosidade, misticismo, saudade e solidão, sentimentos que habitam a alma do homem do interior brasileiro.
A viola caipira teve sempre presença marcante nas cantorias de Devoção, Cantorias de Diversão, Cantos de trabalho ou, mais claramente, na Moda de Viola, na Catira, na Congada, na Curraleira, na Cana Verde, no Fandango, no Cururu, na Folia de Reis, na Folia do Divino e em outras tantas manifestações do folclore brasileiro.
Devemos observar que é muito comum, também hoje, a presença da viola na MPB, o que não deixa de dar um colorido muito especial aos arranjos. Em razão disso, a viola caipira vem assumindo papel cada vez mais significativo, tanto no campo como na cidade.
Sobre esse instrumento, o violeiro e pesquisador Roberto Corrêa, publicou há quase duas décadas a significativa obra: “A Arte de Pontear Viola”, (Ministério da Cultura – Brasília – 2000), fazendo um levantamento completo a respeito deste instrumento, desde os aspectos históricos, envolvendo origens e transformações, passando pelas diversas afinações, técnica de execução e assim por diante.
Mais adiante veremos ainda: “A viola e suas afinações”, “Do sertão para o Teatro”, “Os precursores: Juliõ; Zé do Rancho; Bambico; Nestor da Viola; Moreno; Chará; Tião Carreiro. A nova magia surgiu com Renato Andrade. Depois veio a nova geração: Almir Sater; Adalto Santos; Roberto Corrêa; Passoca; Chico Lobo; Helena Meireles; Ivan Vilela; Paulo Freire; Renato Teixeira; Zè Coco do Riachão; Gedeão da Viola; Tião do Carro, Téo Azevedo; Braz da Viola; Enúbio Queiróz, Reis Moura; João de Souza; Juca Violeiro, Milton Edilberto; Juliana Andrade e Marcos Biancardini, este último representando o que há de mais significativo entre os novos intérpretes da viola da viola caipira.
Pesquisa: Fernando M. Ribeiro
GRANDES TEMAS: O AMOR (QUASE) IMPOSSÍVEL
Exemplos célebres: “Flor do Cafezal”, Cascatinha e Inhana; “Viola Quebrada, Mário de Andrade”, “Caboclo”, domínio popular.
Era de se esperar que o amor fosse um dos temas mais amplos da música caipira, vez que a música e a poesia voltam-se naturalmente para o amor, a paixão, o sofrimento pela ausência, a saudade que nasce da distância. As músicas caipiras falam, normalmente do amor, sublimado, do amor puro, do amor por vezes não correspondido. É quase sempre o peão, o lavrador, o sertanejo que ama à distância, com um amor quase platônico, nunca realizado. Música-referência pode ser, por exemplo, “Flor do Cafezal”, imortalizada na voz de Cascatinha e Inhana. É uma poesia de grande beleza, principalmente quando compara as fileiras do cafezal em flor com noivas que se encaminham para o altar. Apesar do enlevo, resta, no final, a dor da saudade.
FLOR DO CAFEZAL
Meu cafezal em flor, quanta flor, meu cafezal!
Ai menina, meu amor, branca flor do cafezal!
Era florada,
lindo véu de branca renda
Se estendeu pela fazenda,
igual a um manto nupcial.
E, de mãos dadas,
fomos juntos pela estrada,
toda branca e perfumada,
fina flor do cafezal!
Passa-se a noite,
vem o sol ardente, bruto,
morre a flor e nasce o fruto
no lugar de cada flor.
Passa-se o tempo
em que a vida é todo encanto:
morre o amor e nasce o pranto,
fruto amargo de uma dor.
Extraído do livro: De repente, a viola! De Álvaro Catelan & Ladislau Couto
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